sexta-feira, 21 de agosto de 2009

MINHA PROFISSÃO DE FÉ POLÍTICA É O CREDO

Perdido o "Univers" e fracassados os entendimentos para reeditá-lo na Bélgica, Veuillot se encontrava diante de uma perspectiva bem sombria. Era do jornal que tivera a subsistência de sua família, e o seu fechamento a ameaçava com a miséria. Não faltaram ofertas de emprego, algumas bem tentadoras, mas ele sempre as recusava para estar livre no momento em que pudesse reencetar sua carreira de jornalista. Nada o demovia dessa linha de conduta. Completamente dedicado à Igreja, e certo de que era no jornalismo que a Providência desejava que ele trabalhasse, permanecia generosamente fiel à sua vocação, mesmo quando as circunstâncias pareciam indicar que esta se tornara impossível.

Em 1862 os católicos de Avignon se aliaram aos monarquistas e ofereceram a Louis Veuillot uma cadeira de deputado. O Sr. Delcamps em nome dos católicos, e o Conde de Valori no dos monarquistas, foram procurá-lo para o persuadir a aceitar. Veuillot respondeu com uma carta a Delcamps, que é um verdadeiro modelo de desapego, um dos documentos que retrata toda a alma de um homem visceralmente penetrado de espírito de fé e de confiança na Providência:

"Não me sinto tentado. O que faço tranqüilamente em casa vale mais ou menos o que poderia fazer na Câmara, de modo que não sou obrigado a perder minha virgindade em matéria de juramento. Quando eu tinha as simpatias do governo, e não tinha senão ligeiras inquietações pelo futuro, recusei duas vezes a candidatura: a primeira, porque o emprego de deputado me parecia oneroso para um homem sem fortuna; a segunda, porque esse mesmo emprego se tornara rendoso, e porque, em suma, era um presente do poder. Rejeitei as honrarias e os proventos, como já recusara também a Legião de Honra. Sei que o caso agora não é o mesmo, e minha repugnância é também menos forte. Entretanto, para aceitar, desejaria duas coisas que não vejo: o dever, em primeiro lugar; e o apelo do clero.

"Sou muito grato ao Sr. de Valori por ter pensado em mim. Agradecei-lhe de minha parte, e que ele me permita dizer francamente, como entre pessoas que conversam de negócios, que seu patrocínio não é aquele de que necessito. Por mais honroso que seja, é um patrocínio de partido. Ora, não posso e não quero estar comprometido com nenhum partido. O Sr. de Valori compreenderá bem isso; seus amigos seriam provavelmente menos compreensivos. Eu sou sacristão, como diz la Bédollière com muita razão; sou o humilde servidor da Igreja; uso sua libré, e não aceito nenhum outro caráter porque não aceitaria nenhuma outra servidão. Vós lestes tudo o que escrevi, e não tenho, portanto, necessidade de vos dizer o quanto sou monarquista. Mas, antes de mais nada, sou sacristão. Minha profissão de fé, mesmo política, é o Credo. Et unam, sanctam, catholicam, et apostolicam Ecclesiam. É preciso que isso seja dito e ouvido, e que a Igreja me chame para que eu me adiante".

Para manter sua família, Louis Veuillot passou a se dedicar à literatura, e são dessa época a maioria de suas obras, entre as quais as duas mais célebres: "Le parfum de Rome" e "Les odeurs de Paris". Com a literatura ele procurava substituir a tribuna que perdera e manter os inimigos da Igreja debaixo de sua vigilância, sem renunciar ao seu ideal de jornalista, nem muito menos aceitar compromissos que poderiam pôr a perder a sua obra.

O sucesso de seus livros foi enorme. As edições se sucediam, e realmente Veuillot conseguiu, em parte, manter viva entre os católicos a chama ateada pelo "Univers". Do ponto de vista financeiro, o resultado foi muito melhor do que ele poderia esperar. Nunca o redator do "Univers" ganhara tanto quanto o autor celebrado por todos: pelos amigos, que o aplaudiam; e pelos inimigos, que o combatiam com o mesmo ódio de sempre.

Infelizmente, porém, o livro não tem a mesma eficácia do jornal, como arma de combate. Veuillot sentiu bem a diferença quando Pio IX publicou o Syllabus. Embora seu prestígio fosse muito grande, a ponto de sistematicamente os jornais o fazerem co-responsável por todos os atos da Igreja, ele não pôde participar, tão ativamente como desejaria, na polêmica que se travou a propósito da condenação do liberalismo.

Em resposta ao livro de Mons. Dupanloup "A Convenção de setembro e a Encíclica de 8 de dezembro", escreveu "A ilusão liberal", onde desmascara completamente os erros do Bispo de Orléans. Não era essa, no entanto, a parte que Veuillot gostaria de ter na luta. Ele sofria por se ver privado da espada, num momento tão importante para a história da Igreja.

Alguns anos antes, logo após o fechamento do "Univers", Veuillot escrevia a Gustavo de la Tour, durante uma estadia no interior da França: "Todo o aspecto do mundo é triste e horrível em toda parte. Estes lugares que eram bons, e que sob certos aspectos são ainda bons, decaem rapidamente. Vão todos à missa, confessam-se e comungam, mas em primeiro lugar são socialistas, depois partidários do Império, e só por último cristãos. A política, os jornais, os passeios, as tabernas fazem um mal incalculável. Não há mais cabeças: o gênero humano está bem amadurecido para o despotismo, e será ligado como uma alimária em proveito de algumas outras alimárias.... Volto a Paris para acabar um livro inútil".

O livro inútil era "Le parfum de Rome". Diante da decadência do mundo, Veuillot julgava inútil o melhor de seus livros, e só o dever o levava a concluí-lo. Felizmente, o advento do Império liberal iria permitir o reaparecimento do "Univers", e Veuillot então voltaria, com mais ardor do que nunca, a tentar opor um dique a essa avalanche de erros e corrupção que cada vez mais afastava o mundo da Igreja, única força capaz de impedir a sua total desagregação.

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